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A Caracol

Um blogue pseudo-humoristico-sarcástico. #soquenão #ésóparvo

Um blogue pseudo-humoristico-sarcástico. #soquenão #ésóparvo

Oração dos fit's

Treino nosso que nos aguardas

Santificadas sejam as tuas repetições

Venha a nós a tua força 

E seja feita a tua exigência

Tanto no cardio como no ferro

As calorias do nosso dia abate hoje

E perdoa-nos as baldas

Assim como nós perdoamos as manhãs dolorosas

Não nos dês demasiada carga

Mas livra-nos das banhas

Hey-man!

 

 

Para melhores resultados, recomenda-se a oração antes de cada treino e na manhã seguinte.

Experiências #10

- Olá boa noite

- C… C… Carolina! Olá! Boa noite, por aqui?

- Sim, vim cá com uma amiga, mas não sei dela e não tenho com quem falar. Posso sentar-me?

- Sim… Acho que sim… Quer dizer, claro que sim, se acha que… Quer dizer, claro, quer ficar aqui no sofá, que é mais confortável?

- Estou bem, obrigado. Não precisa de ficar nervoso. Já percebi que é uma pessoa tímida, mas eu não mordo.

- É que… fui apanhado desprevenido, não esperava que viesse falar comigo…

- Porquê?

- Porque a Carolina não me conhece, não somos amigos…

- Vamos tratar disso então. Fala-me de ti.

- Eu? Então… Er… O que quer saber?

- O teu nome, para começar.

- Sérgio. O meu nome é Sérgio Ventura.

- Boa! Olá Sérgio. Carolina Carvalho. O trabalho como estagiário no Canal é o teu primeiro?

- Não. Mas é o primeiro na área. Sou licenciado em Audiovisuais e Multimédia, mas até agora só arranjei trabalho em call centers, como caixa de supermercado e em cafés. Nem na FNAC.

- Há quanto tempo estás no Canal?

- Três semanas.

- E o que queres fazer? Quais são as tuas ambições para este emprego?

- Tenho um contrato de seis meses. O que eu queria mesmo era, daqui a uns tempos, estar a fazer o mesmo que a Carolina com o programa da Judite. É exactamente esse o meu objectivo a curto prazo.

- E se eu te ajudar a chegar lá?

- C… Como? Como assim?

- Se eu te ensinar, pouco e pouco, a coordenar o programa da Judite? E um dia mais tarde, se abrir alguma vaga para esse programa ou para outro, já tens alguma experiência, não tens de aprender tudo do zero.

- Uau! Mas isso era óptimo. Claro que sim, oh meu Deus! O que é que eu tenho de fazer para isso acontecer?

- Podes começar por me dizer o que estás a beber para bebermos mais uma rodada

- Não, Carolina. Peço desculpa, mas eu é que faço questão de lhe pagar uma bebida. O que quer beber?

- Um whisky sem gelo e uma água com gás para acompanhar.

- Muito bem. Já venho. Muito obrigado Carolina, um dia que precise de algo, seja o que for, só se eu não puder é que não a ajudo.

Sérgio levanta-se, vai buscar as bebidas e passado poucos minutos está de volta.

- Ainda bem que disseste isso… Por acaso há algo que podes fazer por mim.

- Diga, Carolina.

- Preciso que sigas o meu marido.

- O… O… O quê?

- Preciso que sigas o meu marido. Ele é advogado e todos os dias chega  a casa quando a miúda já está a dormir e a maioria das vezes fica acordado a noite toda. Quero só ter a certeza de que ele não anda a trair-me. Assim, preciso que me confirmes isso. Achas que consegues?

- Sim, claro que consigo. É muito fácil. Hoje em dia já há aplicações no telemóvel para fazermos isso. Quer que lhe ensine?

- Não, não quero ser eu a fazê-lo. Não quero que ele pense que eu estou a desconfiar dele sem motivos. Se não quiseres, eu percebo. E a minha proposta mantém-se de pé. Eu continuo a ajudar-te. E temos de arranjar outra forma de me compensares…

- Não é preciso. Eu faço isso. Só preciso de algumas informações sobre ele.

- Tudo o que precisares. Sou a pessoa certa a quem pedir.

Então, o que eu vou precisar é…

 

Texto original de Mário Pereira

* * * 

 

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Experiências #9

Experiências #8

Experiências #7

Experiências #6

Experiências #5

Experiências #4

Experiências #3

Experiências #2

Experiências #1

Aviso à comunidade

Hoje não há #experiências. 🙁 O Mário não conseguiu finalizar o texto a tempo. Vamos tentar para amanhã, mas não prometemos dada a época mais intensiva de trabalho - aquele que paga as contas. Prometemos voltar à emissão normal mal tenhamos conteúdo para vocês lerem. Até lá, podem sempre contar com altas de doses de parvoeira e boa disposição. 😀😀

Resumo do fim de semana

Em frases curtas que a esta hora ainda não consigo raciocinar direito. Sábado pela matina tive a sensação de que um camião me atropelara durante a noite. Ou isso ou Stalone fez de mim o seu saco de boxe. Não sigam o meu exemplo: nunca façam 3 aulas num dia, onde uma delas significa correr numa terra com mais subidas que a Serra da Estrela. À tarde, escarrapachei o rabo no sofá da melhor amiga e, enquanto os nossos filhos lhe destruíam a sala, vimos o "127 horas". Houve partes em que fechei os olhos, odeio cenas verídicas e saber que alguém passou mesmo por aquilo esfrangalhou-me um bocado os nervos. Ontem decidi ir às compras. Bem dito seja o comércio tradicional! Bagatelas e uma lojinha supimpa onde há entretenimento para a canalhada. Desde cavalinhos, a jogos de madeira ou tablets, o sonho de loja de qualquer miúdo. O problema foi vir embora, que não queria e enconou a despedir-se das meninas todas... Três vezes! Aproveitei a sesta - dele e do pai - para ver um filme sozinha. Não me lembro que filme era porque adormeci também. Choveu ao final da tarde, pelo que ir ao parque estava fora de questão. Fizemos bolachas - de banana e coco - e aventurei-me a fazer manteiga de amêndoa. Bem boa! Não se deve, mas é muito bom à colherada, à gulosa mesmo. Antes isso que meia dúzia de gomas. E foi isto. Ainda falta muito para o próximo? 

Experiências #9

Deambulava pela rua, perdido em pensamentos, quando a viu. Havia passado um ano que saíra de casa e desde então nunca mais a vira. Visitava regularmente a filha, Maria, mas sempre em casa dos avós maternos e com aviso prévio de Carolina, com a data e hora a que poderia aparecer. Estava-lhe grato por isso, podia ter simplesmente alegado que não era uma boa influência para a menina, que era um louco que se recusava a aceitar ajuda médica, podia simplesmente pegar na miúda e decidir que ele nunca mais a via. Não fizera isso, nunca.

Fora difícil nos primeiros meses, não conseguiam sequer falar ao telefone sem descambarem em discussão. Essa fase durou apenas uma semana até Carolina nunca mais lhe atender uma chamada, limitando-se a enviar uma mensagem informativa semanas mais tarde: " A Maria vai passar o dia em casa dos meus pais, amanhã. Caso a queiras ver, podes aparecer das 15 às 17. " Eram sempre assim, curtas e distantes. Deu consigo diversas vezes a tentar ler nas entrelinhas, mas nunca havia, era sempre o mesmo texto, como se se limitasse a fazer copy-paste da mesma mensagem, uma e outra vez.

Há meses que não a via e agora, de repente, ali estava ela, sentada numa esplanada, acompanhada pelo seu chefe, Luís, beberricando um gin tónico elaborado e desfrutando de um final de tarde solarengo. Conversavam entre si, naquela cumplicidade que sempre tiveram e que só é possível quando há um determinado grau de intimidade. Tomás não conseguia perceber o teor da conversa, estava demasiado longe, mas nem tampouco isso lhe interessava. Naquele momento, deu-se ao prazer de a observar demoradamente, como o riso fazia com que os caracóis indomináveis do seu cabelo saltitassem num frenesim. Como o vestido preto, simples lhe realçava a brancura da tez e acentuava as suas já definidas curvas. Reparou num colar, que não o reconheceu e deduziu ser novo. um fio simples, dourado suficientemente comprido para que o pendente que sustinha pousar delicadamente abaixo da linha do decote. Se inspirasse fundo o suficiente, tinha a certeza que lhe conseguia sentir o cheiro perfumado. Ou talvez fosse só a sua memória a funcionar de forma demasiado realista.

O buzinar de um carro apressado, trouxe-o de volta à realidade, estava parado há demasiado tempo, enquanto a observava e rapidamente deixou de passar despercebido entre quem passava, para se tornar num tipo esquisito e com mau aspecto a engendrar alguma façanha. Olhou para a mesa da esplanada uma última vez, saboreando a luminosidade que o sol do final de dia lhe dava ao rosto, salientando ainda mais as suas pequenas sardas, num incrível jogo de constrastes. Inspirou profundamente, tentando descortinar o cheiro do seu perfume por entre o ar poluído de uma Lisboa em azafáma. Mecanicamente, virou costas àquela mesa e voltou à sua vida.

Experiências #8

6:30 da manhã

Carolina liga a água para o seu duche matinal. Nas últimas três semanas, dormiu sozinha pelo menos três vezes por semana. Tomás prepara um julgamento importante e passa as noites em frente ao computador, a verificar detalhes sobre a defesa que tem montada. Uma vez e outra, relê os seus apontamentos e os seus processos. E ela prepara o jantar, mantém a casa habitável, preocupa-se com Maria, faz as compras online e recebe-as ao fim da tarde. O seu vibrador cor de rosa já não a satisfaz o suficiente. Precisa de toque. Despe-se e entra no duche. A água quente acalma-lhe os ímpetos e afasta-lhe os pensamentos pecaminosos. Toma um duche ligeiramente mais longo que o habitual enquanto revê o seu dia. Reunião às 10 da manhã com Luís e a direcção do canal. Às 11, o programa da Judite como habitualmente até ao início da tarde. Almoço na cantina do canal. A tarde ainda está liberta.

Vai à gaveta da lingerie especial. Hoje precisa de se sentir feminina e confiante. Escolhe um conjunto que comprou especalmente para o aniversário de casamento. Entra no closet e analisa as suas opções. Discreta, de cinzento? Não, hoje não. Arrojada, de preto e encarnado? Não, levou para a última reunião. Sexymas profissional, com a blusa laranja e a saia travada. É isso. O decote não é escandaloso, mas permite sonhar. Um colar que chame a atenção para aquela zona. O pendente comprido. Isso mesmo. E agora um casaco… O blazer sem botões. E os sapatos altos pretos. Perfeito.

Desce à cozinha, toma um pequeno almoço leve, apanha o elevador para a cave, entra no carro e conduz calmamente pelas ruas ainda semi-desertas. Às 7:30 estaciona o carro no lugar habitual e percorre o caminho até à sua secretária. Liga o computador e vai à copa preparar um café. Lá, Liga a máquina. Ser a primeira a chegar ao escritório tem vantagens, a copa está limpa só para mim, pensa distraídamente. Nesse momento, entra o estagiário, que a cumprimenta com um sorriso envergonhado. Responde educadamente enquanto a bebida fumegante sai da máquina. Pelo canto do olho, repara que o estagiário olha furtivamente para ela e sorri interiormente. Sabe-lhe bem saber o efeito que tem nos homens. E o puto não é assim tão feio, pensa para com os seus botões. Baixa-se para colocar o copo de papel no lixo e repara que ele lhe olha pelo decote. Demora-se um microssegundo a mais e afasta-se com um sorriso na cara.

A reunião é um pequeno sucesso, pois consegue argumentar com clareza e no fim ouve elogios à sua capacidade de trabalho e apresentação. Luís não tirou os olhos do seu peito, o que significa que a roupa foi adequadamente escolhida. Ao almoço, revê o programa da Judite e encontra um pequeno ponto a corrigir no dia seguinte. Propõe a Judite a alteração ao início da tarde na sala de visionamento e recebe mais um elogio à proactividade. À saída, antes das quatro horas, cruza-se com o estagiário e oferece-lhe um sorriso e um “até amanhã à mesma hora” que provocando um rubor intenso na cara. No ginásio, percorre o circuito de cardio sem se preocupar com a habitual trupe de gorilas a mirar-lhe o rabo enquanto corre na passadeira e faz elíptica. Chega a casa ainda antes das 18h com a sua filha, recebe as compras do Continente, veste roupa confortável, prepara um jantar leve para as duas e senta-se no sofá a brincar com a filha.

Às nove da noite chega Tomás, distante como sempre. Dá-lhe um beijo rápido nos lábios, informa que já jantou e recolhe ao seu escritório. Carolina deita Maria, pega no telefone e liga para Sofia. A amiga atende meio chorosa, tinha tido uma discussão com  o Manel e ele tinha ido para casa dele. Volta a vestir-se e vai ter a casa de Sofia. Decidem ir a um bar para espairecer.

No bar, encontra um grupo de colegas de profissão e troca duas larachas com a pivô da noite, enquanto Sofia conversa animadamente com o ex-jogador de futebol que faz a secção desportiva. Cerca de uma hora depois, nem Sofia nem o futebolista estão no bar e ela fica sem saber muito bem o que fazer. Quando se dirige para a saída vê o estagiário numa mesa de canto agarrado ao telemóvel.

 

* * * 

Texto da autoria de Mário Pereira 

 

 

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Experiências #2

Experiências #1

Experiências #7

Subitamente, o gabinete pareceu-lhe demasiado pequeno. Sentiu-se claustrofóbico, agoniado e o chão parecia movimentar-se debaixo dos pés. O diagnóstico era claro: estava louco. Precisaria de acompanhamento e ficaria dependente das drogas psiquiátricas para o resto da vida. Nunca mais seria a mesma pessoa, perderia o emprego, a mulher e... Maria! Céus, como haveriam de dizer à menina que o seu pai estava mentalmente doente? Talvez Carolina até o proibisse de a ver, para segurança da pequena. Ninguém queria malucos por perto.

A voz grave do Dr Henrique, trouxe-o de volta à realidade. Sem se dar conta, já hiperventilava e transpirava em bica.

- Tomás, isto não é um drama. É perfeitamente possível viver pacífica e tranquilamente com esta condição, mantendo o acompanhamento psicológico com o dr. Gonçalves, fazendo avaliações comigo, regularmente, e algumas sessões de psicoterapia também o vão ajudar a controlar melhor esses impulsos.

- Mas quais impulsos?! Eu não faço nada de anormal, não ando por aí tapado só com uma gabardine a fazer rondas a escolas! - a voz saía-lhe mais fraca que o habitual. transtornada por aquilo que ouvira.

- A primeira coisa que fez, quando aqui chegou, foi alinhar o pisa papéis com o porta canetas, colocando a branca, na mesma posição das restantes, enquanto as contava para si. E mesmo não me falando sobre isso, quase aposto que contou o número de quadros que tenho na parede atrás de mim e que o seu desalinho propositado o incomoda.

Tomás olhou para ele, atónito. Reparara de, facto, nas dezassete molduras que enfeitavam a parede. Cinco grandes exibindo diplomas vários, sete médias com desenhos infantis, certamente deixados por crianças que frequentavam o gabinete e cinco com fotografias de pessoas felizes e sorridentes. Estavam colocadas ao acaso, sem qualquer tipo de ordem e algumas estavam inclusivamente pendidas, como se fossem cair a qualquer instante. Várias vezes refreou o desejo de as colocar alinhadas e direitas, como deviam estar.

O médico observou a interrogação que os olhos do paciente espelhavam. Desde que entrara, sorridente e confiante, haviam passado pouco mais de 10 minutos, Tomás impacientou-se com a posição do pisa-papéis E com um gesto descontraído, como se afastasse um pouco de pó da secretária, alinhou-o rapidamente com a porta canetas. Pedira-lhe para ver a branca, a única cujo bico apontava para o tecto e, após um milésimo de segundo a avaliar o objecto, colocou-a de novo no lugar, tendo o cuidado de colocar o bico em direcção ao chão e exactamente a meio das restantes. Não raras vezes, esfregara as mãos com nervosismo, enquanto fitava de soslaio a parede de molduras que adornavam o consultório.

O transtorno obsessivo-compulsivo era relativamente comum embora o mais frequente fossem impulsos ligados à limpeza e higienização de superfície ou até mesmo em questões de segurança, como o verificar diversas vezes o desligar de uma tomada ou uma porta bem trancada, também era usual existirem estes extremos de busca da perfeição aparente.

Prescreveu a dosagem adequada de clomipramina numa das suas receitas que entregou a Tomás. Recomendou-lhe nova consulta dentro de 15 dias, mas sabia que o mais certo era não ele não comparecer.

 

* * * 

 

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Experiências #2

Experiências #1

Tenho uma relação, mas não sei se deva avançar..

É algo sério, mas não o suficiente - ainda - para me fazer dar o tal passo. Tenho medo do que daí possa surgir, daquilo que me possa trazer, bem ou mal, pouco importa agora.

Ele cansa-me. Moí-me a paciência, às vezes o corpo também, mas não consigo já viver sem ele. O que é completamente absurdo, porque ninguém gosta de uma relação tão volátil, onde só um comanda a direcção que os dois devem seguir.

Tento vê-lo todos os dias e, em certos dias, encontramo-nos duas vezes. Nunca mais de uma hora, mas já é o suficiente para o sentir, para lavar a alma de pecados e regressar à vida normal, por vezes entediante, com aquela energia que só eles nos passam.

Às vezes é violento. Não faz por mal, sei que não, nunca na vida o culparia por isso, no fundo só quer o meu bem e sabe que é exactamente aquilo que preciso. Todos precisamos de uma tareia de vez em quando, torna-nos mais fortes, mais resistentes."O que não nos mata, torna-nos mais fortes" - não é isto que nos dizem as frases bonitas com paisagens de pôr-do-sol ao fundo? É sempre disto que tento lembrar-me quando, no dia seguinte, sinto a moleza que de mim se apodera e me faz chorar baixinho ao dar os primeiros passos pela manhã.

Faz-me andar carregada de tralha: roupa para durante, roupa para depois... É exigente, mas a minha coluna já se começa a ressentir e por isso mesmo, pondero dar o passo seguinte na nossa relação, algo que me traga mais leveza diária, mais liberdade de espaço, que me deixe menos preocupada com a preparação do dia seguinte:

 

 

 

 

 

 

 

 

Pondero, seriamente, alugar um cacifo no ginásio. :D

 

(O que é vocês pensavam que era, suas mentes obscuras?! :P)

 

 

 

 

 

 

 

Experiências #6

- Como é que eu lido com aquele sacana?

- Amiga, sei lá, tu é que o conheces, não eu!

- Será que eu é o conheço? Começo a duvidar…

- Não sejas parva, Carolina. Ainda me lembro quando há me disseste que ias fisgar o advogado bonitão do Presidente do… Qual era o clube mesmo?

- Não me lembro, não é importante. Onde é que queres chegar?

- Onde eu quero chegar? Tu é que decidiste que o ias conquistar, tu é que lhe deste a nega durante meses, enquanto ele praticamente beijava o chão que pisavas, tu é que decidiste como, quando e onde se iam encontrar, tu é que decidiste se iam chegar a vias de facto na primeira noite ou não… Tu é que decidiste tudo na vossa relação. Tu é que és o motor lá de casa. Sem ti a miúda andava vestida com roupa da Primark e ele andava de Citröen Saxo azul cueca, fatos da Giovanni Galli e gravatas da Feira de Carcavelos. Se tu saíres da equação, ele pura e simplesmente torna-se incapaz de fazer algo que não seja relacionado com o Direito. E mesmo isso duvido. Ele venera-te, amiga. E aposto que se lhe pedires o divórcio, ele fica tão de rastos que nem discute e te dá tudo o que quiseres. Só tens que andar para a frente com o pedido…

- Olha querida, tenho que ir, isto de ser a primeira pessoa a quem o Director de Comunicação quer dar trabalho é muito bom, mas tem esta desvantagens. Falamos depois tá? Beijinho e obrigado.

- Beijinho, leoa. Gosto muito de ti, sabias?

- Sei. E eu de ti.

Carolina desliga o telefone, compõe o sofisticado tailleur, confirma que o decote está decente e levanta-se em direcção ao gabinete de Luís. Durante o percurso, pensa na conversa que acabara de ter com Sofia. Já há algum tempo que se questionava sobre o seu casamento. Por um lado, agradava-lhe a segurança de ter alguém quando chegava a casa, cansada de um dia de trabalho. Por outro, agradava-lhe a ideia de recomeçar de novo, escolher novamente um homem, transformá-lo num animal na área em que ele estivesse e claro, pelo caminho divertir-se um pouco com ele. Entra no gabinete de Luís e sorri profissionalmente. Luís levanta o olhar do ecrã do portátil e mira-a de cima abaixo, parando mais tempo do que o que devia no seu peito. Luís era um bom homem, felizmente casado e sem escândalos que se lhe conhecessem, mas tinha uma mente demasiado aberta no que à sexualidade dizia respeito. Não tinha qualquer pejo em mirá-la com ar guloso, de comentar quando ela trazia um conjunto mais arrojado ou de fazer um piropo ao seu rabo ou ao seu peito nas alturas mais desproporcionadas. Inclusivamente, tinha na sua posse registos de conversas privadas no chat da estação em que a linguagem dele resvalou, sem qualquer pejo, para conversas sexuais explícitas. Numa delas, perguntava abertamente quantas vezes por semana mantinha relações com Tomás e quantos orgasmos costumava ter em média. Perguntas às quais Carolina não respondeu directamente mas que a fizeram sorrir, na altura. Sabia que Luís era o seu chefe, mas acima de tudo era um amigo de longa data desde os tempos da faculdade, colega de carteira do irmão mais velho no mesmo colégio em que também ela estudou, o seu padrinho de casamento. Além disso, também foi o homem com quem manteve relações sexuais ocasionais em noites de maior solidão e menor predisposição para a utilização do vibrador. Era a ele a quem telefonava a pedir companhia antes de conhecer Tomás. A relação que mantinha com ele era extremamente profissional dentro do escritório perante os colegas mas, a dois dentro do gabinete ou na rua, era o outro homem perto de quem se sentia completamente à vontade. Era aquele a quem era capaz de dizer as maiores barbaridades e manter as conversas que não tinha em casa.

- Bom dia. Desculpa se demorei Luís, estava a conversar com a Sofia e já sabes como ela é, primeiro que se cale é um sarilho.

- Não tem mal, Carolina. Não tem mal. Bom dia. A Sofia, continua junta com aquele cromo do Manel?

- Sim, estão a pensar em ter filhos em breve.

- Que pena, um corpo daqueles não merece uma gravidez. Vai estragar aquelas mamas todas.

- Desculpa Luís, hoje estou com imenso trabalho por causa da reportagem da empresa da TV Cabo. Chamaste-me para me dizer algo importante?

- Claro claro, desculpa. Temos que marcar uma reunião com a chefia do Canal. Vai haver uma reestruturação e estou a apostar em ti para seres a nova face do telejornal do almoço. Mas para isso, tens de ser devidamente apresentada e vais ter que mostrar todos os teus dotes, que eles olham para ti de lado por eu ser amigo do teu irmão e teu padrinho de casamento. Quando é que te dá jeito para a semana?

- A sério? Eu? Obrigado Luís. Muito obrigado pela confiança. Escolhe tu o dia e a hora, desde que seja antes das onze ou depois da uma da tarde, porque esse é o intervalo em que tou a coordenar o programa da Judite, como sabes.

- De nada. Sabes que gosto muito da tua maneira de trabalhar e acho que tens futuro no canal. E sei que há outros canais de olho em ti para o mesmo espaço. Assim adianto-me a eles. E tu ficas aqui ao pé de mim, que comigo é que tu tás bem. Vou então tratar de tudo e depois digo-te OK?

- OK. Até logo.

Carolina vira costas, sai do gabinete de Luís e entra na casa de banho. Por um lado, apetece-lhe dar pulos de alegria pela promoção iminente. Por outro, apetece-lhe chorar porque vai ter menos tempo para lidar com os seus problemas familiares. Entra num cubículo e senta-se a pensar… “E agora, que raio vou fazer à minha vida?”

 

* * *

Texto da autoria de Mário Pereira.

 

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