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A Caracol

Um blogue pseudo-humoristico-sarcástico. #soquenão #ésóparvo

Um blogue pseudo-humoristico-sarcástico. #soquenão #ésóparvo

24 agosto 2009

Foi há seis anos. Parece que foi ontem e, no entanto, já passou mais de meia década.

Lembro-me de cada detalhe, cada som, como se me tivesse visto cem vezes o mesmo filme, repetido mil vezes aquela cena.

Incrível a precisão com que a nossa mente capta os pormenores. Se fizer um esforço, não é preciso muito, basta um pequeno empurrão, estou novamente naquela segunda feira.

Lembro-me da neblina matinal fria e típica deste mês; de encontrar a tia à saída do hospital e comovendo-me ao ver que carregava um saco com maçãs - fruta que havias pedido na véspera; de percorrer com a mãe a rua que havias indicado, procurando a tua viatura. Lembro-me do cheiro nauseabundo quando a abrimos para verificar que estava, como de costume, sem combustível.

Percorro mentalmente o caminho até às bombas mais próximas, vou de braço dado à mãe, tagarelando trivialidades, fingindo optimismo e rezando a todos os santos (há alturas na vida que o monoteísmo não se aplica, quanto mais melhor) que não assinasses o termo de responsabilidade que te faria sair do hospital. Pelo menos sabíamos onde estavas.

Depois, lembro-me do grito. Tão estridente, tão dolorosamente sentido que quase pude escutar o seu coração partir-se em mil pedaços. Soube de imediato o que acontecera, só isso a faria encolher,agonizar daquela forma. Foi tudo muito rápido e muito devagar ao mesmo tempo. Corri para ela, sentindo o cheiro da gasolina que vertia do garrafão caído. Abraçamo-nos demoradamente, chorando por aquilo que ambas sabíamos ser inevitável, alheias aos olhares interrogativos dos restantes clientes.

Lembro-me de pedir um copo de água, não para mim, mas para ela, que o bebeu tremer de choro. Lembro-me de lhe assegurar, várias vezes, que estava tudo bem e que tinha sido melhor assim. E foi. Por muito que ainda me doa, por muitas saudades que tenha (que tenho, todos os dias), por muita pena que possa ter pelo que não viveste, sei que foi o melhor desfecho.

Lembro-me de me sentir, além de profundamente triste, de certa forma aliviada: a vida que te consumia e nos levava por arrasto, tinha terminado. A partir daquele dia sei sempre onde estás, tenho a certeza que não estás perdido, que encontraste, finalmente, paz.

 

 

 

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