Pneus, reboques, tecnologia e crianças - em 60 minutos de animação
Ontem, atrasadissíma como costume, um pneu do meu carro decide falecer a meio do trajecto.
A chover a potes, com uma criança de 3 anos no carro e com a minha excelente capacidade física... É tudo o que uma pessoa pode querer para começar bem o dia.
Apesar de já desconfiar da minha força para desapertar os parafusos da roda e da capacidade de colocar o macaco no sítio certo sem fazer mossa na carroçaria, lá sai do conforto do banco para “tentar”. E por tentar devemos depreender:
- Retirar a tralha toda da mala para aceder ao material
- Fazer jogos estranhos de kamasutra entre o macaco e o chassi onde nenhum deles encontrava o ponto certo
- Desapertar os parafusos da roda ainda com o pneu no chão (lembrava-me de ser assim) e depois logo se via o que fazer ao relacionamento macaco-chassi.
Ora eu forcei a chave, apliquei toda a minha força (ou talvez não), mas os sacanas dos parafusos não mexeram. Ao fim da primeira tentativa, entro no carro decidida a pedir ajuda externa, ligando para a assistência em viagem imaginando que seria enviada para o real bilhar grande por parte da seguradora, pelo que dramatizei ligeiramente a parte do tentar desapertar os parafusos e omiti a parte de não saber posicionar correctamente o macaco.
- Pois com certeza menina, vamos enviar um técnico.
Eh lá, que se eu sabia nem sequer tinha tentado. E a assistência em viagem agora cobre isto? A evolução é uma coisa espectacular, de facto.
Três minutos depois recebo uma sms a indicar a hora prevista de chegada ao local – cerca de 45 minutos – logo seguida de uma chamada do técnico para saber a minha localização.
- Pois, isso da localização… Eu até faço este percurso todos os dias, mas não faço ideia no nome da rua, mas tentar ser precisa. Olhe, isto é quem vai de Nenhures para Algures, mas por dentro, está ver? Aquela rua que sobe muito, tem pinhal dos dois lados e cruza por cima da auto-estrada.
Bué precisa. Do outro lado e após meio segundo de hesitação:
- Ah, não estou mesmo a ver…. Mas olhe, por acaso não está a utilizar um smartphone com dados móveis, pois não?
Tau! Assim a frio, sem dó nem piedade.
Claro que não, senhor. Lá agora eu ter dessas modernices. Eu nem sequer ainda fiz um post no facebook nem entretive o miúdo com vídeos no youtube para o manter quieto na cadeira - sem sucesso.
- Dois minutos e eu já lhe ligo de volta.
Claro que enquanto acedia ao Google Maps, Caracolinho achou giro esvaziar todo o conteúdo do porta-luvas, mas pelo menos já não esperneava na cadeira implorando para vir para a frente.
A meia hora seguinte foi passada entre “não mexas aí!” e “sim, podes fazer pi-pi mais um bocadinho” – acho que a buzina do carro nunca funcionou tanto como ontem. Quando descobriu que pálas da frente eram quitadas de um espelho com luz, foi toda uma excitação:
- Olha mamã! – apontando para o dito – é o tablet do Ryder! Vou pedir ajuda à Patrulha Pata!
O faz de conta durou até chegar o técnico. Num reboque e-nor-me.
- UAU! Qu fixe, mamã! Nós vamos ali?
- Espero bem que não, rico filho. O senhor só deve trocar o pneu e por-nos a andar.
Ordem para voltar para a cadeirinha, reclamação e quase birra por não querer voltar, promessa de que poderia ver o senhor a trabalhar e a mamã pelo vidro do carro. Resultou e pude passar o tempo que durou o serviço (15 minutos) a segurar no guarda-chuva para minimizar a molha do técnico. Caracolinho não desgrudou do vidro e meia volta lá ouvíamos um “UAU!” fascinado pela aventura matinal.
A meio da conversa, descubro que afinal não foi pelo meu discurso melodramático que enviaram ajuda, mas sim porque a minha apólice abrange assistência a pneus. Não é espectacular? Eu nem sequer sabia que isto existia, mas dá um jeito do caraças! Lá agora apanhar chuva e frio e vento, sujeitar-me a danificar a pintura da viatura com material esquisito e deslocar falanges a tentar rodar chaves de rodas… Muito melhor – e mais eficaz – chamar quem realmente percebe do assunto.
O pneu, pobrezinho, faleceu de vez, apesar das várias tentativas de reanimação da oficina. Não se pode ter tudo, não é verdade?