Foi impulsivo, assumo, deveria ter pensado melhor, delineado uma estratégia, mas... não há uma lei qualquer da vida que diz que devemos esquecer os planos de vez em quando? Que devemos ser espontâneos, em vez de certinhos? É, não é? Então pronto, fiz a coisa certa: limpei o carro. Até aqui nada de mal. O problema é que ele agora cheira a pinho. E eu faço alergia ao pinho. E não o sinto como meu. Já olhei três ou quatro vezes para o interior das portas e nem um lenço de papel usado à vista. Nem uma embalagem de bolachas vazia. NA-DA. E o chão? Sabiam que o chão do meu carro é preto? Também não me lembrava. Já há muito tempo que me habituara ao camel da areia. E pedras? Nem um calhauzinho debaixo do tapete. Nem uma pequena rocha no assento do passageiro. Nem... Nem um pedaço de granito ao pé da manete das mudanças. Está tudo limpo e imaculado e cheira a pinho. Já disse que cheirava a pinho? O problema, para além de ter sido estúpida o suficiente para aspirar areia e não a vender para as obras ilegais, é que estou com problemas de ligação ao bólide. Sinto que lhe fiz um bem maior, mas já não me sinto ligada a ele. Não o sinto como meu. E isso dói, bem lá no fundo, ao pé dos calcanhares. Ah, não, espera, isso é só o tapete que ficou dobrado debaixo do acelerador. Bom, mas dói e temo que a nossa relação não possa vir a ser a mesma de antes. Temo que agora me dê máximos, cada vez que não sacudo os pés do miúdo quando voltamos da praia (e os meus também...). E se me buzina aos ouvidos quando enfardar pipocas lá dentro? Ou batatas fritas. Pior: se lhe dá uma síncope quando sentir o caroço de uma ameixa, embrulhado às três pancadas num lenço de papel, abandonado sabe-se lá até quando no interior da porta. E se... E se... Se o meu carro, de repente, se transformar no meu homem? Pronto, está decido. Vou obrigar o miúdo a brincar com terra na mala. Só manter um certo nível de charme naquele carro.
Ou melhor, sabe, mas apenas em algumas situações que já explico.
Caracolinho tem quase três anos. Fala pelos cotovelos, trepa, corre e salta. Atrapalha-se a contar até 5 e ainda confunde as cores, bem como a distinção entre o maior e menor - o relatório de avaliação que recebi no final de junho, diz que o miúdo tem dificuldades na matemática.
Para começo de conversa: para que raio precisa um chavalo de dois anos e meio, na altura, de perceber matemática? Para que raio quero eu um relatório de avaliação pedagógica semestral? E porque raio está o mundo, a sociedade e o ensino tão preocupados com isso?
À minha volta, vejo pais a quererem que os filhos saibam inglês desde cedo. Que contem até 1500 desde os 10 meses. Que sejam mais, melhores. Do que quem? Do que os próprios pais? Do que o vizinho do lado? Juro que não entendo esta obsessão pelos resultados, pelas metas curriculares impostas desde cedo.
Como disse, o meu filho não sabe, ainda, identificar todas as cores. Nem em português, nem em inglês, nem em jugoslavo.
Sabe, por exemplo, colher morangos, sabendo que só deve colher os vermelhos. Aproveitamos para contar os que trás na mão, mas se encrava no 3, não faço grande drama. Sabe que, na cerca dos animais, há dois gansos brancos, um coelho cinzento, uma cabra branca e uma cabra bebé, cinzenta também. Sabe que o Berlinde é castanho e que o Cusco é preto como a noite. É capaz descer as escadas, sem ajuda, e abre o portão sozinho, todas as manhãs (não, não tenho portão elétrico é tudo manual). Sabe que as ervas à volta das flores não devem lá estar, embora às vezes se engane e lhes arranque uma folha. Ou duas. Sabe bater ovos com a vara de arames e adora cortar massa para bolachas. Diz-vos de cor que "o papá é chato, a mamã é linda, o Mário é espectacular, a tia Sara é gorda e Cláudia vai levar tau-tau", lengalenga ensinada por senhora sua mãe, obviamente.
Não, não quero fale inglês, não quero que saiba contar até 20 e pouco me importa que não identifique ainda as cores.
Quero que corra, que brinque, que pule, que descubra e que explore. Quero que cresça feliz e não a achar que tem que saber tudo. tem muito tempo para aprender matemática e para desenvolver o gosto por línguas. Não agora e não aos dois anos e uns trocos.
É óbvio que sei ao que a pessoa se refere. A isto. A este espaço virtual com nome de um molusco. A resposta, essa, varia consoante o meu humor, a minha vontade e disposição.
A primeira, que me salta logo à boca, é o prazer. Em escrever, em divagar, em aparvalhar, em procurar as melhores palavras para aquele momento. Em entrevistar, em conhecer, em ficar surpresa com a resposta do outro, em dar a volta ao texto porque se esquiva àquilo que pretendo. É um exercício extremamente prazeroso.
A seguinte, numa prespetiva mais egoísta da coisa, acaba por ser o não me sentir sozinha. Não sentir que sou só eu a ter dúvidas na maternidade, que há mais quem não saiba lidar com as birras, com os choros, quem perca o norte nesta aventura. Que não sou a única a maldizer a minha vida enquanto vou ao ginásio, a não conseguir levantar um pêlo no dia seguinte.
Escrevo para os outros, claro, de contrário não teria esta casa, ou torná-la-ia privada, mas faço-o primeiramente por mim e para mim. Pela minha sanidade mental umas vezes, como escape noutras, como forma de rir no meio de um dia de merda.
Raramente consulto as estatísticas. Recebo o relatório mensal do sapo e fico felicíssima ao ver o número de pessoas que por aqui pára. Seja uma ou duas mil. Alguém parar para ler o que escrevemos é o mais gratificante disto. Porque, como já disse, faço por mim, mas para vocês. Que sem isso, sejamos francos, não teria tanta graça. :)
Obrigada a todos os que por cá param, de vez em quando. :)
Fiz mais praia agora, do que antes de ser mãe. Dizem que lhe faz bem, que é saudável, mas para mim chega vê-lo feliz a fugir das ondas e encher-se de areia.
Não é possível ler na praia, tampouco estar sossegada, o único tempo que sentei o rabinho na toalha foi à hora do lanche. Quando havia toalha, claro. Já que na maior parte do tempo, não passava de uma rodilha na areia.
As sestas sabiam-me pela vida. Foram vários os dias em que também eu passei pelas brasas e houve um dia em que fiquei só sentada, a ouvir o silêncio. Nesse dia, perguntei-me como seriam casas com mais de um miúdo.
Retomei as leituras, hábito perdido desde que as horas de almoço foram ocupadas com exercício físico. "O Quarto de Jack" foi o primeiro, uma boa aposta que me foi sugerida pela Magda, o guru dos livros, reforçada pela Alexandra e que me devolveu um prazer não esquecido, mas há muito anulado. Demorei três dias e já nem eu sabia que era capaz de ler tão rápido. Seguir-se-á o "Filho de Mil Homens", recomendado também por aquelas duas almas. Aceito mais sugestões.
Nem só de pão vive o homem, diz-nos a bíblia, e eu acrescento: nem só de praia se fazem as férias. Parques, parquezinhos, zoológicos, quintinhas pedagógicas, bibliotecas... Imensas coisas se podem fazer com miúdos - novinhos, não tenham medo, eles não mordem - que não incluem areia a saltar-vos em cima.
Por falar em areia, tenho imensa. Alguém sabe se aquilo dá para vender? Pensei em utilizar nas obras, mas já me disseram que não que tem de ser purificada e o caraças. Só a que tenho no carro (sim, tenho, ainda não aspirei) daria seguramente para uma arear uma divisão. Ou duas. Não juntei a das toalhas/brinquedos/mochila toda num bidão, mas aposto que daria outro tanto.
Não pus os pés no ginásio. Tampouco fiz qualquer exercício que não fosse: a) correr atrás do puto, b) ser pior do que o puto, o que implica o ponto a) novamente, c) passear, d) exercício de alongamentos aos globos oculares e de repouso ao cerebelo, leia-se dormir. Tudo o resto foi para as urtigas.
Não comi nem uma bola de berlim, na praia. Em compensação, comi mais gelados que no ano passado todo. Nada de grave.
Não estou morena. O que é estranho, porque fiz mais praia do que em qualquer outra altura, mas aceitável porque apenas o fiz duas/três horas por dia, de manhã, sempre que o tempo permitiu. Tenho uma ligeira corzinha, mas muitoooo ligeira, só os mais atentos darão conta.
Ainda agora regressei e já tenho saudades disto. E por aí? Já foram, ainda vão ou não querem ir? Contem tudo!